quinta-feira, 30 de agosto de 2007

A Carta II

Cara amiga :

Volto de férias, e qual não é a minha surpresa ao saber que andaste mais uma vez na farra com as tuas belas amigas. Amigas que não te ensinam nada a não ser como cultivar o que elas melhor são : paranóias. A tua capacidade para escolher amizades já viu, definitivamente, dias melhores, e deixa-me que te diga que nunca foste lá muito boa nesse campo. Ou sais para te enfrascar, ou sais para te lamuriar, e não sei qual delas será a pior.
Bem, seja de que maneira for, eu não sou tua mãe, de todo, não tenho que te avisar ou censurar do que quer que seja.
Sou aquela que te atura, e as minha advertências tendem a ir um pouco mais além do que simplesmente avisos sobre companhias e bebidas ingeridas.
Sou mais aquela que te segura a cabeça quando vomitas como uma cancerosa no auge da quimioterapia ; sou mais aquela que te ouve chorar quando as tuas amigas te atacam em forca, esquecendo, aparentemente, que te levaram a sair como uma delas, para umas noites de borga.

Diz lá o que queres. Tenho mais que fazer.
Espera, eu até sei o que queres, mas como também sei que não consegues nem fazer nem dizer melhor, também sei que está na hora de ser da habitual simpatia e cordialidade para com a tua pessoa.

Já chega.
Pára de trilhar insistentemente esse caminho de autodestruição, de autoflagelação constante pelo qual enveredaste há uns anos, e do qual não te consegues desviar.
Pára de ser ceguinha, de ser chata, rabugenta, picuinhas e rancorosa, porque as coisas não têm necessariamente de ser como antes foram. Deixa ir, deixa passar. Ainda não tens propriamente idade para te agarrar ao que foi com tanta forca. Não tens 80 anos, ainda.
Tens o que queres, e o que não querias, porque era bom demais para ti, também tens. De que te queixas, afinal? De não teres nada que fazer? É mentira. De não teres ninguém que te oiça? Mentira, também. De estares frustrada? Com quê, afinal?

Já sei que é muito giro esta busca insistente pelo mais além, a busca da perfeição, a eterna insatisfação. Já sei que és adepta da filosofia. E o que é que eu tenho a ver com isso? Só para te ouvir, com as parvoíces que as companhias te dizem?
Esquece. Não tenho perfil para educadora de infância. Ao contrário de ti, que parece que te encaixas bem como dona de casa amargurada, choramingas e qualquer dia, hipocondríaca.

Eu diria que o problema é o mesmo de antes.
O tal par de palavras que tu, armada em púdica verbal, não dizes, só para satisfazer o capricho aos fantasmas que vivem aí em casa. E que te fazia mais falta dizeres do que os outros ouvirem. Diria também que eles sabem que palavras são, e que por isso, até te possam perdoar a fraqueza de não as proferires.
Eu não perdoo. E tu também não, por isso é que estou aqui.

Se o teu objectivo é chegar aos 80 anos e perceber que não deste tanto quanto podias, nem viveste tanto quanto querias, estás no bom caminho. É isso mesmo que se deve fazer, guardar tudo para si, viver de paranóias que te toldam a vista e não te deixam aproveitar o que de bom que tens. Porque tens.
Vá lá, só mais um esforço. Não me obrigues a ser sempre uma besta contigo. Deixa-me elogiar-te, nem que seja só por uma vez.
São só duas. Duas palavras. E acabam-se as noites de borga com gente que não presta.

Cumprimentos,
Aquela que te atura.
AS

2 comentários:

Anónimo disse...

O q dizer depois de uma carta tão sincera???? Há lutas que ñ têm fim....lololololol

Diligentia disse...

Nem sabes tu da missa a metade
AS