segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Curtas

Imagine-se um metro cheio de gente, uns velhos, outros novos, uns cansados, outros nem tanto, com frio ou calor, pensativos, tristes, satisfeitos, remediados, uma amalgama de gente anónima que caminha todos os dias na mesma direcção sem olhar para o lado. No entanto, estão todas estas pessoas no mesmo local, num local que se mexe, que anda sobre carris para levar os passageiros de um lado para o outro para chegarem aos seus destinos, e junta-os o facto de se encontrarem no mesmo sítio, como quem diz, que coincidência estamos todos aqui, é verdade quem diria, gente que nunca se conheceu e nunca mais se verá na vida no mesmo sítio à mesma hora, que engraçado, então não é, olhem para mim a rejubilar com alegria do acaso.

E nisto, há alguém que se lembra de ter pouco trabalho para obter bens que demoram muito tempo a comprar com suor do próprio rosto, e principia a colocar a mão na propriedade alheia. Isto, com toda a gente, no mesmo sítio, à mesma hora já referida a assistir. E assiste impávida e serena, como quem vê um filme, ou um jogo de futebol em que se fez um grande passe que indubitavelmente levará ao golo, entusiasmando-se ligeiramente com o espectáculo como se fosse algo digno de admiração. E quando outro alguém se lembra, oh tristeza profunda pela consciência social, de avisar o pré-lesado do que está prestes a suceder, eis que pode finalmente a multidão rejubilar pela causa que não chegou a dar-se, exactamente a causa contrária por que há segundos se alegrariam se de facto acontecesse.

E vão todos para casa comentar o sucedido, como uma aventura emocionante que viveram na primeira pessoa para poderem dizer de sua justiça, à boca cheia, o mundo está perdido, já nem se pode andar na rua, isto é que anda aqui uma gatunagem, que pouca vergonha, raio de país este, a culpa é do governo porque não faz nada, não, a culpa é do Presidente da República que deixa fazer nada, então e a polícia, a polícia não faz nada nem pode fazer, isto está assim desde a fundação e a culpa é do Afonso Henriques. E vão, todos contentes, porque o mundo é um lugar de perdição, e hoje assistiram a uma amostra dela.

Esqueceram-se foi de dizer que hoje tiveram culpa que o mundo fosse um lugar de cabrice perfeita. Também foram responsáveis. Assistiram e nada fizeram.



Que sentido é que isto faz?

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