sábado, 8 de dezembro de 2007

Presunção Ilidível

Tempo perdido é uma expressão extremamente usada no vocabulário das gentes habitantes no planeta terra. Não contentes com a complexidade da palavra e do conceito de tempo em si, crêem piamente que adicionar-lhe outro termo, não menos complexo, é facilitar de alguma forma a justificação de tantas outras expressões que ficam por explicar.

Perder, de facto, tempo é o que se faz todos os dias, seja em que circunstância for. É inevitável ; há sempre algo que se faz que não vale mesmo a pena, que não dá frutos nenhuns, que só serve para dar coisa nenhuma a quem o faz. Não há um único dia em que pelo menos um minuto não seja dedicado ao lazer de perder tempo com alguma coisa. A questão é que perder tempo não é o mal em si.

Pior, é a presunção de que se pode recuperá-lo, de que se pode voltar atrás e fazer como se nada se tivesse passado, como se o tempo que se gasta a fazer o que provavelmente não se devia pudesse andar para trás, como se tivesse um botão de rewind nos fundilhos.Presunção essa que se torna idiota até à exaustão quando quem a quer fazer funcionar insiste em procurar incessantemente o dito botão, mesmo estando farto de se saber que nunca existiu.

Se a noção de tempo pedido é complexa, e até descabida, mais estúpido se torna a vontade de recuperá-lo por força da activação de uma presunção que só com muita sorte não é inconstitucional. Se há coisa que não é passível de alteração, ou de recuo é o tempo. Mesmo que a seguir venha arrependimento, ou remorso, ou consequências nefastas do que foi feito, mesmo que venha perdão, reconciliação, retorno da situação antes existente, o que foi feito é apagado. Fica marcado, apontado na linha do tempo, mesmo que seguidamente venha uma rectificação do acto viciado. Nada se apaga, não se esbate, mesmo que seja esquecido. Porque o tempo tem boa memória.

Recuperar tempo perdido é uma perda de tempo em si. Porque não é possível voltar atrás com o tempo, muito menos com o tempo que se perdeu. Há inutilidades a que se dedicam horas, minutos do dia, porém esse tempo fica sempre dedicado a essas mesmas futilidades ; não se pode subtrair tempo ao que não interessa para aplicar no que se julga interessante quando já se gastou tempo na primeira hipótese. Gastou-se, acabou, expirou. Não é passível de recuperação.

Recuperar tempo perdido não existe. Não é possível. Passou o momento. Passou o tempo. Não há volta, sem retorno. O que se faz é tentar colmatar as falhas do passado com o tempo que se tem presentemente. E mesmo assim, se me perguntarem, já se vai tarde. Mais uma vez, perde-se tempo, que a seguir faz falta para qualquer coisa mais interessante, e que inevitavelmente, se vai sentir que a perda de horas pesa novamente na medida da presunção. Totalmente ilidível.





AS

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