O que o Antro tira com as duas mãos, dá com um dedo do pé.
Anos e anos de esmagamento psicológico, de humilhação, de rastejar para conseguir sobreviver, e de repente aparece uma benção caída do tecto do Antro aos trambolhões. Não se percebe como acontece, sabe-se que cai por ali, do tecto para o colo do pobre coitado, humilhado, esmagado, espezinhado durante anos, que não tem bem a certeza de ter merecido a oferenda. Noutras batalhas, travadas outrora, em que o que estava em jogo era bem mais valioso, o Antro cuspiu-lhe na cara, mandou-o passear, mandou-o procurar vida em outro sitio que não aquele. E de repente, é como se a Pocilga, o Antro, a Choça, se tivesse arrependido do que antes fizera e agora quisesse compensar pelos incómodos causados.
Como é possível, como é possível o Antro de meros e reles mortais se apiedar? Será que pressente que está a chegar o tempo de fazer as malas e partir, sendo esta a forma de dizer adeus e pedir desculpa por qualquer coisinha?
Não, não é possível ; tem que haver algum senão para esta bela.
Porque aquilo que o Antro tira com as duas mãos, devolve com um dedo do pé.
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