segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

A Carta VI

Cara Amiga :

Faz tempo que não te escrevo, nem mando uns bitaites sobre a tua vida. Afinal, estou a revelar-me menos atenta do que deveria. Talvez, e creio que essa é a verdade, é que não precisas tanto de mim como outrora, e por isso cada vez me esqueço mais da tua existência. Mesmo assim, de quando em vez, sinto saudades tuas – e sinto mesmo, não é só saudade de mandar vir contigo – e tenho vontade de escrever-te.

Também tenho reparado que te estás borrifando para o que possa dizer, ou escrever, o que, com franqueza, não te posso censurar ; tenho sido tudo menos boa amiga e só te contacto para te chatear e fingir que sou boa vidente, que sei tudo e tenho todas as soluções para todos os problemas que possam surgir, sem nunca me lembrar que afinal não precisas de mim para nada.

E , verdade seja dita, alguma vez precisaste? Algum dia necessitaste, verdadeira e francamente que, nos teus piores dias, alguém te fosse martelar o juízo com factos cruéis, dos quais tu eras a primeira a tomar conhecimento? Alguma vez necessitaste, de facto, que alguém te esfregasse sal nas feridas, quando o que era necessário era que tas tratassem, para de alguma forma, aplacar a dor? Algum dia na tua vida necessitaste de ouvir verdades, que talvez de verdades tivessem muito pouco, factos dos quais estavas mais consciente que ninguém?

Olho neste momento para trás, e percebo que não. Não, não precisaste de mim para nada. Tudo o que te disse, já sabias, já tinhas consciência, já o tinhas interiorizado. Sabias como resolver sem que ninguém te dissesse o que quer que seja, e resolveste por ti, sem consultar ninguém, e saíste-te bem. Sem precisares de mim, sem nunca precisares de mim. Nem de ninguém. E eu, durante tanto tempo julgava-me heroína da tua causa, a salvadora dos teus caminhos, aquela que te aturava em tudo e tinha sempre razão.
Estava enganada. Redondamente. E o tempo só veio dar razão a esta premissa. Tenho sido um peso morto na tua vida, um reflexo de gente que se julga grandiosa sem o ser, um empecilho. Um caco velho sem utilidade.

E gostava de participar nas tuas vivências, de partilhar contigo o que vês e sentes. Como julgava que antes acontecia, mas percebi que não passava de um erro.
Julgava que era alguma coisa, mas não sou ; julgava erradamente que precisavas que alguém te abrisse os olhos de vez em quando, mas não é verdade, porque já não os tens fechados há muito. Estás em paz com o que és, também há muito tempo, o que não deixa espaço para mim. A bem da verdade, alguma vez houve esse espaço? Alguma vez precisaste que existisse?

E agora és tu que não queres que esteja por perto. Não queres nada meu. Não queres saber de nada que me diga respeito.
Não te censuro. Fui tudo menos decente contigo. Nunca gostei de ti, e quando mais precisavas, pisei-te os dedos para que caísses no abismo. Agora que não tenho mais ninguém, fazes-me falta. E como tens mais juízo e decência que eu, fechas-me a porta na cara.

Contra mim falo, mas não podia estar mais orgulhosa de ti. Só prova como não precisas mesmo de mim para nada. Como fui um empecilho este tempo todo.
Não sei se vale de alguma coisa pedir desculpa. Mas fica a tentativa.
Cumprimentos,

Aquela Que Já Não Te Atura





AS

1 comentário:

Лев Давидович disse...

Olha que estas amigas tendem a voltar...