sábado, 24 de novembro de 2007

Chá da Pérsia - Parte VII

- Espere!
- O que é agora?- gritou o génio, recuperando o acesso de mau humor.
- Posso desfazer os dois primeiros desejos que me concedeu?
O homem reagiu como se tivesse levado uma pancada na cabeça.
- O quê?? Então está aqui um tipo a ser simpático, a conceder desejos a quem tropeça nas coisas porque não vê por onde anda, e vem-se-me esta tipa com estas lérias?- o mau humor regressara em força, mostrando o seu lado feio. – Não há vergonha! Nem consideração por ninguém, pelo trabalho dos outros! Quem penas tu que és para desprezares o que te é dado dessa maneira?
- Não é nada disso, tenha calma. Deixe-me explicar
- Explica-te! - ordenou o génio.
- Acho que não vou precisar dos outros desejos. Se serei feliz, como o senhor me faz crer, não precisarei de ser extraordinariamente rica, nem de ter uma saúde inesgotável. Não preciso desse dinheiro todo, posso trabalhar para ter o que comer.
- Então e a saúde inesgotável? Não precisarás dela?
Pensou uns segundos. A resposta surgiu resolutamente.
- Mesmo que morra aos 40 anos, terá valido a pena. Prefiro definhar e morrer jovem, sabendo que tive o que queria, que fiz o que queria, que fui realmente feliz, do que viver indefinidamente sem nada que me suporte, que me complete.
Por momentos, parecia que o homem iria ter um outro ataque de fúria e má disposição. Depois, os lábios rasgaram-se num enorme sorriso.
- Compreendo. Uma escolha acertada, se me perguntarem. Afinal, pode resumir-se tudo num único desejo. Tenho que comunicar ao meu patrão. Como é que ninguém se lembrou disto antes?
- Então, pode inverter o que lhe pedi antes?
- Já esta feito.
Foi a vez dela sorrir.
- Obrigado.
- Não estavas atrasada? – gritou o homem de novo. – Vai-te embora! Tenho mais que fazer!
Virou costas, deu uns passos para continuar a descer a rua, quando se lembrou. Voltou a virar costas ao destino que seguia para falar com o génio.
- Voltarei a vê-lo? - perguntou.
Mas o homem já não estava lá.
Do fumo azulado e da chaleira velha, nem sinal.
Tinham desaparecido.
AS

2 comentários:

Лев Давидович disse...

Sabendo que o futuro lá pertence a essa entidade inexistente, será, ela, feliz?
Oxalá que sim.

Diligentia disse...

Com toda a certeza, sim.
AS