quinta-feira, 21 de maio de 2009

Ode ao DIP

Bem haja ao senhor dos caracolinhos desalinhados que desbravou os caminhos da ignorância dos cérebros virgens em matéria de situações jurídicas internacionais.
Bem haja ao senhor dos caracolinhos que imiscuiu o seu nariz descomunal nas vidas de quem tinha a paz em seus corações.
Bem haja ao dito senhor, de olhos brilhantes de maldade, que rejubila de cada vez que compreende que quem para ele olha nada percebe do que é dito.

Oh Paulita dos caracóis desalinhados, como era bom que nunca os teus passos tivessem cruzado o meu caminho.

Como seria esplendorosa a estrada caminhada se não viesses também... trouxeste, quais ventos de tempestade, a boa da norma de conflito, toda a sua teoria, toda a sua devolução e referência material, as sociedades, a capacidade, a qualificação. E tudo isto ao mesmo tempo. E o que mais houver. Mais as convenções e os regulamentos. E porquê? Com que propósito? Para que serve? Para que serves tu, afinal? Para passeares o teu olhar cheio de ódio pelos que te ouvem? Para te encheres de felicidade quando a ignorância, sempre presente, mostra todos os seus prismas nas nossas cabeças? Para onde me guias tu, afinal?

Bem haja a senhora de boa vontade que com bonequinhos coloridos pretende levar a bom porto uma barcaça cheia de porquinhos cor de rosa, para o sacrifício.
Bem haja a senhora que não gosta que se roam as cartilagens das extremidades superiores, nem que se desalojem símios da cavidades nasais por forma a prestar a máxima atenção ao princípio da harmonia de julgados.
Bem haja a querida senhora que guia todos os leprosos à agua sagrada da cura e da salvação internacional.
Querida senhora, que em maldade e desprezo pelos porquinhos bate todos os pontos da Paulinha Nariguda, capitã do navio frontal de uma imensa e mortal frota, que se prepara para apontar e lançar canhões à cidade sitiada. Senhora da norma de conflito, que faz com que as teorias do direito civil de todo o mundo pareçam uma brincadeira de crianças pequenas. Senhora do Mal, que trouxestes o DIP para o nosso seio imaculado, manchando-o de terror e imundice.

Porquê? Porquê eu? Porquê agora? Porquê neste momento, porque só agora, no fim, no término, no derradeiro momento? Porquê? Porquê, Paulinha?

Porquê o tiro no escuro, porquê a facada, não nas costas, sempre se sabia que algum dia haveria de chegar esta hora, mas no coração, faca afiada, aguçada como nenhuma outra, dilacera pele, músculos e tendões até chegar ao pontinho mágico, também ele atingido, que extingue a vida.

Porquê, Paulita, porquê?

Dar-te-ia todo o meu cabelo, para que substituísses esses cachos de melena descorados, dava-te toda a minha cor por uma resposta.

Responde-me! Fala comigo, seu animal, responde-me!

Não sei o que escrevi, não me lembro do que sabia, escrevi de olhos fechados, à espera que alguém os abrisse e me mostrasse o que fazer. Não sei a resposta, e perco-me nas linhas cheias de tinta, mascadas pelas minhas mãos, que seguram na caneta e a fazem deslizar febrilmente. Não sei responder.

A capacidade normalmente está incluída na noção mais ampla de estatuto pessoal. O 47º tem alguma a coisa a ver com o estatuto real. O 16º é a regra geral de referência material excepcionada pelo 17º e pelo 18º. Eventualmente pelo 19º, quando não haja reenvio. O 20º é para ordenamentos jurídicos demasiado complexos para se encaixarem nas regras normais.

Porquê, Paula? Responde-me.

É por ser burra? É por não estudar? É por não saber, de todo, as coisas de raiz?

Porque me odeias tu, cónego do demónio?

Não sei a resposta, nunca a soube, nunca a tive. E agora, que escrevo eu? Que mais escreverei quando me faltarem as invenções? Que mais escreverei quando não mais puder esconder que não sei a resposta? Não sei.

Bem vindos, senhoras e senhores, ao admirável mundo sempre novo do DIP, o único rico em sais minerais e normas de conflito fresquinhas.
Bem vindos, caros amigos, a uma viagem sem fim pelo coração palpitante do direito. Viagem por uma via nunca antes viajada. Uma viagem inesquecível, que ficará para sempre gravada nas peles e almas de todos. Memorizem todos os momentos, fixem caminhos, decorem pontos de referência. Lembrem-se de tudo o que aprenderam. Só para não morrerem estúpidos, não vale a pena.

Porque não há regresso do mundo do DIP. É uma viagem só de ida. Não há como escapar, a morte avizinha-se. E todos, pelos trilhos enlameados dos esgotos, caminhamos de mãos dadas, todos em fila, os lindos porquinhos cor de rosa, guiados pela Senhora do Mal e pelo senhor dos belos caracóis. Caminham sem parar, sem descanso, sem alimento. Porque ainda há o direito real, o sucessório e o de propriedade intelectual, e as sentenças estrangeiras que necessitam de reconhecimento. E o 16º é a regra geral, enquanto 17º e o 18º o excepcionam. Forein court theory.

E os dois seres guiadores de almas já só levam um porquinho para o sacrifício. Os outros nunca chegaram a escolher o caminho da perdição.

Porquê, Paula?

Bem vindos ao mundo do DIP. Admirável.
Tudo isto existe.
É triste. É DIP.

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