terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Puta dos Filhos

Tenho uma tia que, há uns belos anos, quando ainda não tinha filhos, adorava espalhar aos quatro ventos que os filhos dos outros eram todos, sem qualquer excepção, uns selvagens, uns rufias e uns malcriadões do pior.

Adorava encher a boca dizendo que ninguém lhes dava educação, que era uma pouca vergonha, que eram respondões e faziam muito barulho, que guinchavam e trepavam árvores, que nunca paravam quietos e que mais pareciam filhos do Mogli do que pessoas civilizadas.


A começar e a acabar na sua ilustre sobrinha, claro.


Até ter filhos dela, obviamente. Posteriormente, não perdeu tempo a mimar o puto como se mais ninguém na terra tivesse filhos e tornou-o num terrorista da quinta casa.

Hoje, desafortunadamente, lembrei-me da minha tia.

À hora do almoço, tive o (des)prazer de sentar-me junto a uma adolescente e sua mãe, que discutiam alegremente.
Vi e ouvi aquela amostra de gente, armada em ursa, a sacudir a cabeleira em todas as direcções, a bater as pestanas para o reflexo no espelho, a falar com a mãozinha caída como as tias de Cascais, a gritar e a mandar a sua mui amada mãezinha para sítios menos próprios, aos segredinhos e risinhos com a sua amiguinha enquanto comentavam o que o os outros traziam vestido, o que os outros tinham na cara, o que os outros tinham no prato. E aquela mãezinha, que, para os outros é muita má, e vai tudo à frente, e eu é que sei, e ninguém grita mais alto que eu, confrontada com a má criação do seu rebento, acha muita graça. Acha mesmo muita piada. A miúda tem personalidade, diz ela.

Pois eu chamo-lhe falta de porrada. Durante aqueles 15 minutos que aquela avestruz ali esteve, fantasiei ardentemente em amarrá-la a um poste e chicoteá-la até a deixar sem sentidos.

Depois, lembrei-me da minha tia.
Lembrei-me do que ela gostava de apregoar e daquilo que, depois, muitos, muitos anos mais tarde, lhe calhou na rifa.
Lembrei-me do ar superior dela a criticar os comportamentos dos filhos alheios e o que o seu filhinho se tornou.
Lembrei-me da cara dela de enjoada ao lembrar-se amargamente de todas as palavras que proferiu sobre os filhos dos outros, olhando para o seu rebento a despir-se num restaurante, a atirar facas às cabeças das pessoas, a bater com paus nos que passavam na rua, a dizer asneiras a toda a hora, a deitar-se no chão a fazer birra e todas as outras merdas que aquela criatura fazia.

Lembrei-me. E mentalizei-me que, com a sorte que eu tenho, um dia que venha a ver filhos, vão ser piores que a garota que tem a mania que tem o sol no cu.


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